A tal guerra que nos torna guerreiras
Things will never be the same mas eu ainda me pego imaginando quem é que eu seria hoje se a vida tivesse sido outra. Não foi. Não sou.
O dia 28 de Setembro marca desde 1990 o Dia de luta pela descriminalização do aborto na América Latina e no Caribe.
Eu li numa matéria da BBC que os países Latinos que permitem o aborto incondicional nas primeiras semanas de gravidez atualmente são cinco: Uruguai, Cuba, Guiana, Guiana Francesa e Porto Rico.
E aí eu pensei pela milésima vez sobre como não poder abortar mudou minha vida porque não me deu outra opção além do sim. Pensei sobre como isso fez com que eu dissesse adeus a tudo o que eu conhecia, my hopes and dreams, e encarasse responsabilidades que não eram só minhas porque that's just the way it is.
Pensei na menina que teve que morrer aos poucos porque a mulher que eu sou hoje precisava existir. Things will never be the same mas eu ainda me pego imaginando quem é que eu seria hoje se a vida tivesse sido outra. Não foi. Não sou.
Pensei também no livro da Thaiz Leão que chama o Exército de uma Mulher Só e nos mil significados que esse título me permitiu construir. Lembrei da dedicatória que menciona a criança que a tornou mãe e a sociedade que a tornou exército; a sociedade que me tornou exército.
A Thaiz escreveu assim:
"É muito fácil me confundir com uma "guerreira", e olha que (...) eu não me alistei para guerra alguma, eu só caí no front com uma camisola desbotada e florida que minha mãe costurou, tendo de proteger meu sexo da sociedade, de homens mais velhos e, mais adiante, dos da minha própria idade, e ainda brigar todo dia por oportunidade, igualdade e reconhecimento em todas as outras áreas da minha vida.
Conheço milhares de mulheres, mas não conheço nenhuma que seja forte, dura ou calejada porque resolveu ser. (...)
Dessa tal guerra que nos torna guerreiras, eu quero ver o fim de pé."
Eu não ia te escrever sobre isso hoje, mas comecei um outro assunto e apaguei tudo — porque percebi a data e concluí que não dava pra falar de outra coisa.
Quando eu falo sobre aborto legal e seguro é pra que nenhuma mulher morra por querer escolher. Eu falo também sobre aquelas que, como eu, não tiveram escolha — e precisaram morrer de alguma forma pra poder continuar a viver.
"Que a nossa luta seja sobre nos aproximar do que a gente ama, e não sobreviver àquilo que nos aniquila."